Os outros - Cap. V

quarta-feira, 13 de agosto de 2014



Cap. V
O Smoking Negro


Era uma sexta-feira, havia chegado em casa um pouco cansado, mas contente por uma semana bastante produtiva, já começava a achar que vivia uma vida sem problemas. Como de costume verifiquei a caixa dos Correios, Conta de água, Luz, um teclado novo que comprei pela net, já que o último derramei Coca-Cola, e um envelope fora do comum. A principio não havia reparado neste, mas fui abrindo de um em um, apenas surpreso que mesmo com o ultimo aumento na energia, a minha conta continua praticamente com o mesmo valor, talvez seja pela preferência de viver num breu a noite. Ao ver o ultimo envelope meu cérebro despertou em instantes, o velho instinto da observação voltou a ativa, observei o envelope à luz, tentei sentir o seu cheiro - mesmo sendo algo inútil já que foi algo enviado há alguns dias - até aí tudo normal, meu CEP e nome na frente, mas nem sinal do remetente, abri com cuidado e me reparei com algo que jamais esperava... Um convite, não era um convite qualquer, naquele instante tive um choque, um pavor e temor que fazia muito tempo que não sentia, aquele era o convite da "minha morte".
A semana se passou e tentei esquecer aquilo, só estava em dúvida, se aceitaria ou não aquele convite. Não queria eu ser invasivo, talvez aceitaria, mas não queria pensar naquilo por em quanto. Mas para a sua surpresa, na quinta-feira da semana seguinte, recebeu uma ligação, era quase 21:00 hr. normalmente não recebia ligações naquele horário, esperou tocar mais uma vez e atendeu:

- Alô!?
- Oi, só liguei para saber se você vai? - Respondeu uma voz feminina - Tudo passou a minha mente em segundos, memórias de uma vida, assim me lembrei rapidamente de quem e do que se tratava,então respondi:
- Ah, sim, claro que irei, porque não iria?
- Ah, não, não achei que recusaria, você não faria algo do tipo comigo. Mas liguei apenas para te pedir algo. Ainda é músico? - Explicou ela.
- Hum, ah sim, ainda sou haha.
- Então... Teria como você ir tocar violino lá?
- Ah sim, tem sim, só violino? 
- Fica a seu gosto querido amigo, se você cantar melhor ainda, ah e se puder leve sua banda. Quero que encante como sempre encantou.
- Tudo bem, farei o que for possível ok?
- Ok. beijos
- Adeus. - Sussurrei respondendo.

Talvez aquela noite tivesse sido uma das piores de todas desde que parei de dormir tarde de mais. Não conseguira pregar os olhos. Mas ao passar das horas e na turbidez do cansaço em fim apaguei. 

Bem, não poderia mais fazer a desfeita, logo liguei para meus velhos amigos da banda, marcamos uns dois ou três ensaios, e preparei o melhor repertório de músicas que pude. Achei talvez que minha morte solene fosse mais alegre por isso. 
Era véspera do grande dia. Ainda não havia escolhido minha roupa, então me dirigi ao guarda-roupas para preparar tudo. Mas ao ver meus 4 ou 5 ternos de cores pouco diferenciadas, resolvi fazer diferente: Comprar um Smoking. Sim, raramente alguém vai de smoking a um evento como esse, mas possa ser que tenha alguém a traje, mas fazer diferente era o que eu queria: "O Smoking mais belo e especial que encontrar na cidade, não importa o preço." Minha loucura era eminente, talvez aquilo tudo já estava fora do meu alcance, mas mesmo assim, fui em busca do que eu queria, em fim achei, não demorei muito, não há muitas lojas com trajes deste tipo. E comprei aquilo que seria o traje da morte. O melhor smoking da cidade, denominado de "Dark Smoking", assinado por um estilista inglês.

Afinal, o dia havia chegado, arrumei tudo, fui ao meu próprio fúnebre. Tocava Bach atrás de Beethoven, algumas composições minhas, enfim, todos sorriam. E por ali minha mente já não estava mais a mesma, não raciocinava, não pensava, não imaginava, não morria. Me retirei dali como um vulto, sem dar satisfação a quem de direito, mas isso não importava mais, o tempo já passou. Cheguei a porta do estacionamento e a chuva desabava como uma sinfonia em que eu regia... Tudo desabava... Corri ao carro, e ao entrar enviei uma mensagem a um dos integrantes da banda: "Deixe minhas coisas lá em casa, o porteiro tem a chave". Sempre me perguntei porque deixar minhas chaves com o porteiro, praticamente tinha sido como um melhor amigo ultimamente. Talvez achasse que morreria em meu apartamento e não queria deixar o prejuízo da porta arrombada. Arranquei o carro, sentindo o frio da chuva entrar pelos dutos de de ventilação do carro, finalmente respirei... Últimos suspiros talvez...
Não sabia bem para onde ir, mas por alguns instantes meus instintos me guiavam, e percebi que ocasionalmente eu estava indo em direção ao sitio de meus pais. O porque até hoje me pergunto, mas enfim, segui com o caminho, sem ao menos avisar que estaria de chegada já que se aproximava das 00:00 hr.
Cheguei no portão e dei uma buzinada meio sem jeito, mas percebi que ainda havia luzes acessas dentro de casa, logo vi minha mãe saindo de guarda-chuva, abaixei o vidro e gritei: Sou eu Mãe! Logo ela veio abriu o portão, estacionei o carro e saí correndo meio escorregando na grama molhada, com os sapatos que havia ganhado de natal de alguém que ainda não me lembro.
Minha mãe me viu e logo veio me abraçar, sim, um abraço verdadeiro. E me logo perguntou: "O que tá fazendo aqui menino?". Respondi apenas com um sorriso. Entramos e senti a ausência do meu pai e a perguntei: "Cadê o papai?", ela respondeu: "Foi buscar seu irmão no aeroporto, pensei que estavam combinados que viriam para cá". Então falei: "Não, eu não sabia, na verdade eu vim aqui porque precisava vir, sei lá, viver de verdade, respirar, o bom é que estaremos todos juntos este final de semana". Ela disse: "É mas seu irmão disse que voltou pra ficar de vez... E afinal, porque está vestido de smoking?" E respondi sorrindo: "Ah mãe, é uma longa história, onde está o vaso de biscoitos? Vai demorar um pouco." 

Talvez aquela noite tenha sido a melhor de todas, não porque havia de morrer, mas sim pelas altas gargalhadas que dei junto a minha família, talvez não, mas no fundo, meus instintos não me deixam morrer. E o tal smoking eu dei um fim apropriado, guardei para minha próxima morte.

8 comentários:

  1. Não entendi muito bem o texto (afinal, ele morreu ou não?kk), mas achei bem interessante, muito bem escrito! Adorei.
    www.espacegirl.com

    ResponderExcluir
  2. Eu também me perdi um pouco ... morreu sim, ao menos foi a impressão que eu tive!
    Jean escrevendo com maestria, gostei.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. A solução está nos detalhes haha, estou torcendo para que alguém encontre a luz perdida no texto, se não vou ficar triste com isso... Mas muito obrigado pelo elogio.

      Excluir
  3. HAHAH, gostei deste! Causou meio que um "mistério", sabe, já que alguns não sabem se ele morre, hahauhsuah.
    Gostei bastante, Jean!!!
    Beijos e fique com Deus!
    Batom de Framboesa

    ResponderExcluir
  4. Como vc disse no meu blog temos que aprender a viver todos os dias, nunca será perfeitos e teremos que conviver com isso bem se quizermos ser felizes.


    Nossa que texto fantástico!! me prendeu do início ao fim!!!! muito bom mesmooooo ... eu senti que por o personagem pensar que iria morrer, ele sentiu mais vontade de viver!!!

    http://virtualparadisee.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
  5. PORQUE PAROU DE POSTAR CARA POSTA MAIS POSTA POSTA
    http://na-ve-gan-do.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir

Pensamentos Irreais